Métodos Proibidos de Recolta: o problema de bazares, sorteios, rifas, vendas, quermesses etc.

Você já comprou um almoço realizado pela igreja com a finalidade de recolher dinheiro para a construção do templo? Já comprou um bilhete de rifa para ajudar nas despesas de um dos missionários da igreja? Já comprou roupas no bazar organizado pela igreja para levantar fundos para o evangelismo local? E aquele lanche estilo fast-food vendido pelos irmãos com o objetivo de apoiar financeiramente um ministério da igreja? Afinal, qual o problema dessas práticas? Não estamos, com estes métodos, monetizando e avançando a missão de Deus na Terra?

O que diz a Bíblia e os escritos de Ellen G. White

A Bíblia e os escritos de Ellen G. White (EGW) claramente desaprovam o uso dessas estratégias de levantamentos de fundos em nossas igrejas. Você pode facilmente ler uma excelente coletânea de conselhos de EGW no livro Beneficência Social (BS), Cap. 39 – “Métodos proibidos de levantamentos de fundos” e no livro Conselhos sobre Mordomia (CM), Cap. 41 – “Métodos Populares de Apelo”.

Nestes capítulos EGW esmiúça algumas práticas, citando como métodos proibidos de recolher meios financeiros para a igreja: festins, glutonarias, ceias, convescotes [piqueniques], danças e festivais com o propósito de levantar fundos para o tesouro da igreja (BS 289.1), sorteios, exposições e jogos (BS 289.2), festas, bailes, luxuosos banquetes (BS 289.3), vendas, comidas, festanças, rifas e coisas semelhantes (BS 290.1), bazares, concertos, quermesses e entretenimentos similares (CM 204), subornos de banquetes e divertimentos em geral (CM 203), bingos, salão de jogo, boliche, esportes (CM 201). Alguns desses métodos são proibitivos em si mesmo, na sua essência, como os jogos e esportes de competição; outros não são necessariamente maus, como a venda e o sorteio, mas o denominador comum que os une como métodos inadequados é o objetivo de angariar recursos para a igreja.

Segundo EGW, esses são “métodos inventados por mentes carnais a fim de conseguir meios sem sacrifício” (BS 289.1). Os recursos obtidos desta forma são “ofertas coxas e enfermas” (BS 289.2) pois apelam para a luxúria do apetite ou apelam para o recurso do divertimento para que os irmãos “se abneguem”, abnegação tal que não seria feita simplesmente pelo amor de Cristo e Sua obra (BS 289.3). Em outras palavras, esses meios incentivam e fortalecem o egoísmo e o apetite natural, justamente o que precisamos vencer agora, no tempo do fim (BS 290.1). Além disso, esses meios tornam-se um mal testemunho para os incrédulos, visitantes, jovens, novos na fé, inclusive para os irmãos já firmes na fé (BS 290.2, CM 201). EGW é enfática e dura ao dizer que esses meios “são uma abominação para o Senhor” (BS 290.3) e que “o Senhor não aceita tais ofertas” (BS 290.2). Palavras duras!

Métodos modernos que contradizem esses princípios

Algumas práticas modernas que contradizem esses princípios são:

1. Venda de alimentos para obtenção de recursos para a igreja

Geralmente são vendidos alimentos que contrariam os princípios bíblicos: chocolates, pastelarias, doces (açúcar refinado), carnes, refrigerantes etc. e nunca os alimentos que Deus nos instruiu (mesmo que fossem vendidos alimentos saudáveis, o objetivo de obter recursos para a igreja não seria certo). Enquanto os irmãos da igreja não doam de bom grado, apela-se para o apetite não santificado para obtenção do recurso que não sairia sem este apelo (leia CM 202).

A propósito, no livro BS, no Cap.38 – “Vendagem de alimentos”, o título do capítulo (que não é inspirado) distorce o verdadeiro conteúdo das declarações elencadas, pois EGW nunca apoiou a venda de guloseimas e alimentos que apelam para o apetite não santificado com a finalidade da obtenção de recursos, seja na igreja quanto nos acampamentos da igreja, leia, por exemplo, Conselhos sobre o Regime Alimentar (CRA) 329. No capítulo 38 do BS, ela incentiva a venda de alimentos saudáveis em nossos restaurantes vegetarianos na cidade ou em pontos de aglomeração de descrentes, sempre concomitante ao trabalho de instrução nos princípios de saúde e da temperança, não visando ganhar dinheiro para o avanço da Obra (leia BS 284-288).

Neste tópico, se inclui também a venda de alimentos para captação de dinheiro para sustento do ministério dos jovens, desbravadores e aventureiros (venda de sorvetes e picolé, doces, bolos, pastéis, pizzas etc.), para o evangelismo local, para auxílio de um irmão doente, para a formatura de alunos da Escola Adventista, para obter recursos para retiros etc. A causa que o dinheiro será usado não santifica o método para consegui-lo.

2. Sorteio de qualquer tipo de brindes

Inclui sorteios com o objetivo de incentivar irmãos a comparecerem na igreja, no culto jovem, todos os dias da Semana de Oração etc. Para incentivar os irmãos a convidarem pessoas para o evangelismo (“convide pessoas, traga visitantes e ganhe/concorra a um brinde”); para incentivar os visitantes a participar da programação (“venha no evangelismo e concorra a um eletrodoméstico”) etc. Se o povo de Deus precisa de brinde para incentivar a frequência nos cultos e para convidar pessoas para o evangelismo, precisamos urgentemente rever nosso cristianismo!

3. Venda de qualquer tipo de material para angariar recursos (camisas, chaveiros, casacos, bonés etc. com expresso objetivo de vender e obter lucro para auxiliar os ministérios). Poderiam ser comercializados a preço de custo, sem margem de lucro, de preferência fora do ambiente e arredores da igreja;

4. Rifas, sorteios, bingos e carnês para angariar dinheiro para os ministérios, para levantar fundos para a construção da igreja, para levantar recursos para um irmão enfermo, para obter dinheiro para sustentar um missionário etc.

5. Brechós e bazares com a finalidade de obter dinheiro para sustento dos ministérios etc. Toma-se as roupas e calçados usados dos irmãos da igreja (que deveriam ser doados gratuitamente) e vende-se a preços módicos para obtenção de recursos (montante que facilmente poderia ser obtido por meio de ofertas voluntárias).

6. Atividades extra-igreja para levantar fundos para o ministério: lava-jato e outras atividades pagas dos jovens, desbravadores e aventureiros para conseguir recursos para acampamentos, programações especiais, Camporis e Aventuris (pior que ainda divulgam no sábado na igreja local).

Todos esses métodos falham no mesmo princípio: aquilo que não ofereceríamos a Deus liberalmente e de bom grado (pode ser nossos recursos, nosso dinheiro, nossa presença na igreja), somos incentivados a dar com segundas intenções!

Se a igreja não tem o perfil e o histórico em auxiliar a causa liberalmente, deveríamos muito nos preocupar com a espiritualidade e conversão dos irmãos. Se, por exemplo, o plano de coletar alimentos sem nenhuma contrapartida não geraria o engajamento da igreja, mas o incentivo que ganhar um brinde daria ânimo para os irmãos doarem, então deveríamos nos preocupar seriamente com a espiritualidade dos membros desta igreja!

O caráter de Cristo precisa ser reproduzido em nós (Cl 1:27), toda nódoa, todo traço de egoísmo, todo traço de manifestação do eu tem que ser vencido aqui na Terra, para que recebamos o selo de Deus (Testemunhos para a Igreja [T5], vol. 5, 214). É com o caráter transformado que o Evangelho será pregado em todo mundo e então virá o fim (compare Mateus 24:14 com Parábolas de Jesus [PJ], 69). Esses métodos populares de apelo não cooperam com a edificação de um perfeito caráter cristão, pelo contrário, incentivam o egoísmo e destroem os princípios da verdadeira mordomia. Se o “espírito de liberalidade é o espírito do Céu” (CM 19), precisamos incentivar esse espírito aqui na Terra. Por outro lado, “o espírito egoísta é o espírito de Satanás” (CM 19). E o mais trágico de tudo é que esses métodos retardam o retorno do Senhor Jesus nas nuvens dos céus (2Pe 3:12, a Segunda Vindo de Jesus está sendo atrasada a mais de 100 anos, veja em Mensagens Escolhidas [ME1], vol.1, 67-69 o motivo!).

Outro aspecto pernicioso é que esses métodos destroem o fundamento da verdadeira educação cristã. Tenha em mente que: a educação é um “desenvolvimento harmônico” (Educação [Ed] 13) de todas as faculdades do homem; a obra da redenção e da educação “são uma” (Ed 30); o objetivo da verdadeira educação é “restaurar no homem a imagem de Seu Autor” (Ed 15, 16); “o amor… é o fundamento da educação verdadeira” (Ed 16) e “a abnegação é a base de todo o verdadeiro desenvolvimento” (Ed 16). Em outras palavras, a imagem de Deus no homem precisa ser restaurada para habitarmos na Nova Terra. A imagem de Deus é Seu nome simbolicamente estampado em nossas testas (Ap 14:1). Seu nome é Sua glória e Sua glória é Seu caráter (cf. Êx 33:18, 19; 34:5-7). Então o amor, a abnegação, o serviço desinteressado é essencial e deve ser colocado como base e fundamento de nossas ações, contrapondo o egoísmo e a satisfação própria. Cristo deu o exemplo para nós, Ele é nosso Exemplo. “A grande lei da vida é a lei do serviço em prol de outrem” (Ed 103), “o amor e interesse próprios devem perecer… a lei do sacrifício próprio é a lei da preservação de si mesmo” (Ed 110). Para evitar mais delongas, recomendo todo o livro Educação.

EGW lamenta “ser um fato deplorável” (BS 291.2) que o amor dos irmãos não seja o combustível para voluntariamente sustentar a obra com ofertas. E tudo isso tem base bíblica: EGW cita o exemplo de Moisés na construção do Tabernáculo do deserto: “O plano de Moisés no deserto para levantar recursos foi altamente bem-sucedido. Não foi necessária compulsão. Moisés não fez grandes festas. Não convidou o povo para cenas de alegria, danças e divertimentos em geral. Nem instituiu sorteios ou qualquer coisa de natureza profana para conseguir recursos a fim de erguer o santuário de Deus no deserto. Deus pediu a Moisés que convidasse os filhos de Israel a trazerem suas ofertas. Ele foi autorizado a aceitar dádivas de todo homem que desse espontaneamente, de coração. Essas ofertas voluntárias vieram em tão grande abundância que Moisés proclamou ser o bastante” (BS 291.3, ênfase acrescentada).

Eis o plano: ofertas sacrificais voluntárias! O bom samaritano não abençoou o judeu ferido pensando em “ganhar” algo com isso (Lc 10:30-37). Dorcas não auxiliava o povo pensando em retorno (At 9:36-40). Pedro e os apóstolos não pregavam e curavam pensando em algo como retorno, pelo contrário, eles repreenderam Simão, o Mago, pelo seu interesse carnal no dom celestial (At 8:9-22). Os cristãos primitivos venderam tudo para auxiliar os necessitados, não pensando em receber algo em troca (At 4:34-37), mas a cobiça e o traço egoísta de Ananias e Safira os condenaram (At 5). Os próprios pioneiros da Igreja Adventista do Sétimo Dia venderam e doaram tudo para pregação do Evangelho eterno. O próprio Jesus nunca “trocou” as bençãos dos Céus por recursos terrenos. “De graça recebestes, de graça dai” (Mt 10:8). Ele cumpria literalmente a lei do serviço abnegado. Ele amou e Se deu (Jo 3:16). O amor verdadeiro é necessariamente voluntário, se dá, se entrega. Não estou dizendo que os irmãos que contribuem usando o método errado estão com intenções erradas, mas que isso pode levar a ter os motivos errados na hora de contribuir, arruinando os caracteres, segundo EGW (CM 202), colocando em risco nossa própria vida eterna.

O melhor plano de arrecadar dinheiro para os ministérios ou recolher roupas e alimentos para os pobres é seguir o plano de ofertas de sacrifícios. Que cada irmão se abnegue e doe voluntariamente. Preguemos os princípios da verdadeira mordomia (o livro CM é fantástico nesse ponto), incentivemos o amor sacrifical, a abnegação, a doação desinteressada, o sacrifício próprio. Façamos um plano para cada membro da igreja doar R$ 10,00 mensais para fins de beneficência, pode até fazer um carnê de doação voluntária. Eu morei em uma cidade em outro estado (sem parentes e família) e passei bastante dificuldade financeira, mas nunca R$ 10,00 doados à igreja me fez falta. Se na igreja tiver 100 membros que comprem essa ideia, são R$ 1.000 mensais. Se 1 kg de arroz for R$ 5,00, o montante daria para comprar 200 unidades e na verdade até mais, pois R$ 10,00 seria apenas um valor mínimo.

Por quê não incentivar a prática do jejum, a prática da reforma de saúde, a economia equilibrada e a simplicidade? Incentivemos jejuns semanais e a economia de recursos com esta prática sejam investidos na obra social e evangelística. Coloquemos em prática os princípios da reforma de saúde, da temperança e da reforma de vestuário e economizemos dinheiro com remédios e consultas médicas, economizemos com alimentos que degradaram nosso corpo, com alimentos comidos fora de hora, com a extravagância no vestuário, com os luxos em nossas casas e igrejas. Incentivemos o sacrifício próprio, um plano pessoal ou um sonho de infância, que pode ser postergado e os recursos serem investidos em uma Causa maior. Muitos recursos seriam economizados se fôssemos modestos, temperantes, decentes e simples. Uma das formas pelas quais Deus usou nos tempos de Israel foi o segundo dízimo, uma oferta do valor do dízimo, mas específica para o auxílio dos pobres e necessitados dentre o povo. Você pode ler mais sobre o segundo dízimo no livro Patriarcas e Profetas (PP) Cap. 51 – “O cuidado de Deus para com os pobres”.

Quero agora trabalhar uma questão “gramatical”. Se um projeto de levantamento de recursos é baseado numa troca (“doe um alimento e concorra a um brinde”, “compre um alimento e ajude na construção da igreja”, “traga visitantes e concorra a um presente”, “compre uma roupa no bazar e ajude na pregação do evangelho” etc.), esse projeto não pode ser chamado de “solidário”, afinal toda “troca” tem que ter uma contrapartida de quem está dando, toda troca é uma permuta. Além do mais, a apresentação desses projetos (banner, anúncio, forma de apresentação etc.) se assemelham com “promoções de supermercado”! Precisamos nos abster de toda a aparência do mal (I Ts 5:22). Por outro lado, usei acima a expressão “doação voluntária” ou “doação desinteressada”, que na minha opinião é um pleonasmo ou redundância, afinal toda doação tem que ser voluntária ou desinteressada. Será que o uso e disseminação desses métodos populares de apelos tem moldado nossas mentes de tal forma que precisamos agora adjetivar o termo “doação”, para melhor entendimento das pessoas?

Infelizmente muitos dos líderes da igreja não conhecem ou não veem o quanto este assunto é importante. Não posso e nem quero julgar o porquê dos posicionamentos desses líderes. Alguns retrucam dizendo que esses métodos populares de apelo são utilizados pela Associação, União, Divisão, pela TV Novo Tempo, pelo UNASP, pelo Pr. Fulano etc. Se esses métodos antibíblicos foram utilizados por alguma instituição da igreja, pela TV Novo Tempo, pela Associação Geral, pelo Pr. Ted Wilson ou por quem quer que seja, não deveria importar muito. Deveríamos nos importar com o que Deus diz na Bíblia e no Espírito de Profecia. “À lei e ao testemunho!” (Is 8:20), devem ser nossa guia. Afinal, líderes humanos e instituições não são infalíveis. Como disse EGW: “pode o púlpito [os pregadores, o pastor, a Associação, União ou Divisão, a TV Novo Tempo, o UNASP, o Pr. Ted Wilson etc.] defender…” esses métodos “para obter recursos para os planos da igreja; mas não participemos de nenhuma dessas coisas” (CM 202, ênfase acrescentada).

P.s.: Não questiono as motivações dos irmãos nem nego a utilidade do “resultado” desses métodos populares, contudo a benção que provém desta prática não santifica os métodos, assim como a oferta de um cafetão não santifica a prostituição ou que o fato da oferta de Ananias e Safira ter sido usada para ser bênção para o povo, não santificou a prática avarenta do casal (At 5). Deus é especialista em transformar a oferta falha do pecador em benção, mas isso não dá o aval para que as práticas erradas se perpetuem. Permita-me repetir: a motivação do doador nunca foi questionada. Entretanto, podemos fazer coisas erradas, mesmo com a motivação correta. E os resultados desta prática podem acarretar sérios danos espirituais para nós e para a igreja, danos que Deus não operará para neutralizar apenas porque tivemos as melhores intenções. Além do mais, se temos uma clara orientação da vontade de Deus, que reprova nosso erro e nos mostra o ideal, por quê não acatar imediatamente esta orientação?

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